sábado, 21 de novembro de 2009

O homem das castanhas

No Outono, costumava aparecer na cidade um "homem das castanhas" que espalhava no ar um cheirinho bom a castanhas assadas! Distracção minha ou não, este ano ainda não o vi.
Por isso, lembrei-me de deixar aqui este poema lindíssimo de Ary dos Santos. Como não consegui encontrá-lo cantado por Carlos do Carmo (não sei porquê), fica a poesia e uma viola fantástica que acompanhará o fado na nossa cabeça. Até pode ser que aprendamos a cantá-lo! Sabe-se lá!



Na Praça da Figueira,
ou no Jardim da Estrela,
num fogareiro aceso é que ele arde.
Ao canto do Outono,à esquina do Inverno,
o homem das castanhas é eterno.
Não tem eira nem beira, nem guarida,
e apregoa como um desafio.

É um cartucho pardo a sua vida,
e, se não mata a fome, mata o frio.
Um carro que se empurra,
um chapéu esburacado,
no peito uma castanha que não arde.
Tem a chuva nos olhos e tem o ar cansado
o homem que apregoa ao fim da tarde.
Ao pé dum candeeiro acaba o dia,
voz rouca com o travo da pobreza.
Apregoa pedaços de alegria,
e à noite vai dormir com a tristeza.

Quem quer quentes e boas, quentinhas?
A estalarem cinzentas, na brasa.
Quem quer quentes e boas, quentinhas?
Quem compra leva mais calor p'ra casa.

A mágoa que transporta a miséria ambulante,
passeia na cidade o dia inteiro.
É como se empurrasse o Outono diante;
é como se empurrasse o nevoeiro.
Quem sabe a desventura do seu fado?
Quem olha para o homem das castanhas?
Nunca ninguém pensou que ali ao lado
ardem no fogareiro dores tamanhas.

Quem quer quentes e boas, quentinhas?
A estalarem cinzentas, na brasa.
Quem quer quentes e boas, quentinhas?
Quem compra leva mais amor p'ra casa.

2 comentários:

  1. Na inesquecível noite de 11 de Outubro vi pela primeira vez, este Outono, um carrinho de castanhas a fumegar!
    Não era um homem que as vendia, era uma mulher! :-))

    Abraço

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  2. É verdade, Rosa, já nem me lembrava! Foi tudo tão intenso que esqueci a senhora das castanhas!
    E ela bem aproveitou a ocasião e a euforia. Fez bem, "quem não sabe ser caixeiro fecha a loja", não é assim o ditado?

    Grande abraço.

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